segunda-feira, 18 de outubro de 2010
A festa

Luzes, sorrisos, então isso é a "felicidade"?
Minha boca adormecida em palavras presas em labirintos
Minha boca adormecida em palavras presas em labirintos
Passam zunindo as cantoras em seus balanços, leves, vazias...
todas iguais, diferentes de mim, que não sei sorrir
Antes de tudo no agitar das taças, eu não havia me dado conta
que daqui onde estou não posso ver as estrelas
daqui não posso ver a mim mesma, não posso ver as cidades distantes
que daqui onde estou não posso ver as estrelas
daqui não posso ver a mim mesma, não posso ver as cidades distantes
Será que posso respirar?
Fugir talvez, eu pensaria, para longe de todas as cores cintilantes, do absinto...
Poderia simplesmente sair correndo com meu vestido enfeitado
Poderia borrar a maquiagem e rugir como um leão, desritmando a harmonia barulhenta
Mas eu só estou aqui, e todos estão vazios e todos estão ao meu redor
Se eu me chamasse José, poderia perguntar " e agora?"
poderia saber que a festa acabou, poderia ser insana e anônima
poderia ser um grão de areia dentro de um corpo do mar, eterna até a chegada do corsário
e lá esqueceria de tudo num beijo congelado, a festa me é distante
Se eu encontrasse, no brilho desses olhos cintilantes, na multidão que dorme
Uma rota de fuga que me fizesse voltar
Exatamente ao ponto em que perdi as estrelas
Exatemente ao traço mal guiado do destino cigano
longe da festa sem sentido, sem doce, sem estrela e sem mar...
Toca o sino, no embalo desesperado, alguns correm com os pés descalços
Espero por alguém que não está na multidão
Que me convide a fugir, de volta para o meu lugar perdido...
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Pétala, pó e vento

Perdida manhã sem passado
Sou nada mais, conceitos, verbos, sou códigos
Nem o silêncio, nem o nada, na arena um ósculo cego
pois o corpo não é habitado por paz ou delírio
A alma labirinto. Não me encontro: sou-me em deserto
Nem cruel, pois sem gosto amargo, inefável, pois sem sangue, pulso
Nem dia ou noite, pois só o que é vivo contradiz
Palavra, nome daquele que morreu, leva o que apago
Palavra, digo que sou, mas não estou aqui, verso-retroverso
Palavra, etério, emerito, perfeito, verbo
Nem o profundo disfarce por trás da máscara
Nem a verdade da cara velha, pálida mácula
Nem anjo ou demônio: só.
Rumo sem estrada, estúpida razão
No escuro do mundo, clarão da estrela de ontem: Tempo
Algo que é concreto e sente o absurdo das coisas: Pétala
Esse que não tem nome, é luz pois vive múltiplo e dentro: Tempestade
Pulsa, palavras mudas, empilhados muros de medo e pó: Silêncio
Esse que não tem nome, derrota-me ainda que forte
pulsa-me mistérios e rios, corpo que é e que sou
No escuro clarão do mundo, estrela de ontem: Tempo
Vive o que é vazio e me vive dentro: Pétala
Pulsa o que é belo, sonhado, me tece em teia de véu e silêncio: Tempestade
Noite, nasce-me tranquila de ti, sem ser sonhada, envolta em pedras e muros de silêncio e pó:Morte.
terça-feira, 5 de outubro de 2010
O tribunal de Osíris

Quando cheguei lá tudo era diferente do que eu pensava
Olhei para as minhas mãos e eram as mesmas, só que mais pálidas
Tudo era claro, limpo, branco e nú, assim como eu estava
Eu não sentia frio, nem medo
Não havia ouro, rubís, lápis-lazuli...tudo era leveza, sem grilhões
Apareceram 42 juizes, que eram como eu, puros
pareciam feitos do fino orvalho de um oásis de luz
Os 42 me mostraram cada um dos meus erros
nenhum deles perturbou minha paz, mas cada dor foi revivida
Depois me mostraram as minhas glórias
Revisaram meus desejos, minhas injustiças, meus escritos incompreendidos
depois de ter provado do bom e de mal que havia em mim
Arrancaram-me o coração
Eu não senti dor
Prepararam uma balança, leve, dourada, tênue de inexistência
Pousaram ele com delicadeza, ainda batendo sobre um dos pratos da balança
No outro, uma pluma, feita de nada e de mim mesma
Ambas se equilibraram, eu respirei profundamente e disse: sim...
Então um silêncio ainda mais profundo se instalou desde tudo o que existia
Então me fizeram as duas ultimas questões para o fim do julgamento:
Você foi feliz?
Tudo continuava branco, leve, silencioso...
Minha boca se abria ainda sem saber qual seria a minha resposta...
Você fez feliz a alguém?...
Finalizando essa resposta, me seria dada a sentença...
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